quinta-feira, 3 de junho de 2010

A DROGA DAS DROGAS

1. Na Jamaica, o tráfico de drogas é tão importante que até já fez eclodir uma verdadeira guerra entre traficantes e autoridades policiais. Segundo se diz, com um trágico saldo de mais de sete dezenas de mortes, maioritariamente, no lado dos traficantes.

2. Bandos de traficantes coligaram-se para resistir às autoridades, ganhando, assim, força para se oporem à ofensiva policial. Por mais estranho que pareça, os sectores mais pobres da população de Kingston, a capital da Jamaica, colocaram-se em defesa dos traficantes, para impedirem que o líder do principal gang fosse detido e, depois, extraditado para os Estados Unidos.

3. Ao contrário da Jamaica, em que o líder do gang é idolatrado por alguns segmentos sociais, nos EUA ele é procurado e reclamado, pelos laços que estabeleceu com os traficantes locais. O comportamento daquela parte da população de Kingston, os deserdados, é que torna importante introduzir o problema nesta sede, neste artigo.

4. Outro facto igualmente interessante aconteceu na Argentina, onde foi detida a colombiana Angie Sanclemente Valência, ex-Rainha Nacional do Café da Colômbia, acusada de chefiar uma rede de mulheres traficantes de cocaína com destino ao México e à Europa. Antiga Miss, Modelo e Actriz, Angie Sanclemente Valência foi presa numa Pousada de Juventude, em Buenos Aires. Quer, então, dizer que a gestão do tráfico de drogas está “democratizada”, pelo menos, do ponto de vista do género. São homens, são também mulheres – não há discriminação.

5. Do Brasil vêm notícias sobre o crescente poder e instabilidade social gerada pelos traficantes. Os bandidos não se coíbem mesmo de colocar em estado de sítio a capital, Rio de Janeiro. Há áreas onde eles imperam sem limites, relegando as autoridades para uma posição defensiva. E mais, não são poucas as vezes que se detectam estreitas ligações entre os traficantes e agentes da polícia, ou mesmo até com políticos. No Brasil, o tráfico de drogas está intimamente ligado a outros crimes, como lavagem de dinheiro, sequestros, corrupção política, prostituição, etc.

6. Com frequência, ouvimos falar de detenções em território brasileiro de cidadãos angolanos envolvidos no tráfico de narcóticos. Há dias, por exemplo, estive no Brasil, e soube que se contam por dezenas os cidadãos angolanos, homens e mulheres, remetidos para as prisões brasileiras, pelo facto de terem sido transformados em “mulas” por traficantes ardilosos.

7. Estamos, ainda assim, perante o chamado “peixe miúdo”. Por isso, a solução encontrada é simples: remetê-los para a cadeia, onde expiarão os seus crimes. Porém, o que a experiência de vida nos mostra é que, geralmente, quando se avista um cardume de “peixe miúdo”, muito próximo dele haverá, seguramente, “peixe grosso”. Porque este último alimenta-se do primeiro…

8. Estatísticas muito recentes apontam o tráfico de drogas como sendo o segundo item do comércio mundial, superado apenas pelo comércio internacional de armamento. O comércio de drogas situa-se mesmo à frente do comércio de petróleo.

9. Se somado ao valor do comércio do tabaco e álcool, que também são droga, o comércio global de drogas supera, inclusive, o comércio de bens alimentares.

10. Os principais mercados produtores de drogas localizam-se em países subdesenvolvidos. Porém, os mercados de consumo são, preferencialmente, países capitalistas mais desenvolvidos, quer na América, quer na Europa. E o segmento social mais afectado pelo consumo de drogas é a juventude: jovens desempregados e jovens oriundos de classes abastadas.

11. Geralmente, as situações de guerra funcionam como um estímulo ao consumo de drogas. Por exemplo, durante a guerra do Vietname, constatou-se que cerca de 40% dos soldados consumia heroína, e cerca de 80% consumia maconha. Diz-se, igualmente que, depois de regressarem às suas famílias, a maioria desses jovens abandonaram o consumo de drogas, retornando ao estado normal. Terá sido, pois, um consumo transitório e o modo que escolheram para ludibriarem o stress e as tensões criadas pelo estado emocional.

12. Eu não tenho dúvidas de que muitos dos jovens que hoje deambulam pelas nossas cidades (feitos loucos) são, na sua grande maioria, vítimas de traumas de guerra e da ingestão de drogas. A droga faz, pois, parte da vida humana, e não escolhe povos nem raças, embora certos tipos de consumos sejam característicos de determinados segmentos sociais. Tudo em função do poder de compra de cada um.

13. Mesmo que um certo número de substâncias psicotrópicas sejam produzidas em países desenvolvidos – como as anfetaminas, LSD e o ecstasy – há, porém, actualmente, países subdesenvolvidos que se transformaram em verdadeiros estados narco-produtores. São os casos do Afeganistão (com o ópio), e do Peru e Colômbia (com a cocaína). Tiveram, pois, que reciclar a sua agricultura a favor da produção de narcóticos, como em outros países na América do Sul, na Ásia do Sudeste, no Médio Oriente.

14. A Guiné-Bissau também é tida como um narco-Estado. De tal modo que os Estados Unidos da América relacionaram o recente levantamento militar em Bissau com a prevalência dos traficantes na instituição militar. Foram mesmo ao ponto de identificar um dos actuais líderes da rebelião militar, que culminou com a prisão do Primeiro-Ministro e do Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas, dizendo que se tratou de uma acção inspirada por narcotraficantes.

15. Essas questões aconteceram a milhares de quilómetros de distância do nosso país. Porém, deverão servir-nos de referência. De modo algum será sensato, por exemplo, pensarmos que estamos imunes contra situações idênticas.

16. Presentemente, nada indicia ainda que factos como esses nos venham também bater à porta. Todavia, a apetência por dinheiro fácil está a enraizar-se tanto entre nós que poderá mesmo vir a transformar-se em cultura.

17. Não estranharei, por isso se, um dia destes, ouvir dizer que redes internacionais de tráfico de drogas já se instalaram no nosso território, encontrando acolhimento e inúmeras facilidades. Logo, com capacidade para iludir e ludibriar as nossas autoridades.

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