segunda-feira, 21 de maio de 2012

O FIM INGLÓRIO DE SUSANA INGLÊS NA CNE


  1. A decisão do Tribunal Supremo de anular a nomeação de Susana Inglês para o cargo de presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) criou um facto político que não só fez abalar o quadro político nacional como, também, está a levantar certos questionamentos.



  1. A Dr.ª Susana Inglês dirigiu a CNE em substituição do ex-titular, o Dr. Caetano de Sousa, precisamente porque a lei antes em vigor o impedia de exercer tal cargo. Melhor dizendo, de acordo com essa lei, a CNE não podia ser presidida por um juiz. O presidente da CNE tinha quer ser um advogado. Daí que se tenha procedido à substituição do Dr. Caetano de Sousa pela Dr.ª Susana Inglês que, supostamente, não era juiz. A Dr.ª Susana Inglês é advogada registada na Ordem dos Advogados de Angola e, nessa qualidade, estava até integrada num escritório.



  1. Com a substituição da lei antiga por uma nova, passou a exigir-se ao titular a condição de juiz. Estranhamente, a advogada Dr.ª Susana Inglês passou, como que por artes mágicas, a ser tida como juiz – título a que renunciara voluntariamente.



  1. O concurso público para prover o cargo de presidente da CNE foi organizado pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial que é dirigido pelo presidente do Tribunal Supremo, o Dr. Cristiano André. O Conselho elegeu a Dr.ª Susana Inglês para dirigir a CNE, desencadeando, de imediato, um coro de protestos no seio da classe política na oposição. A eleição de Susana Inglês para dirigir a nova CNE estimulou também tímidos murmúrios entre juristas ligados ao regime.



  1. Face à onda de contestação levantada pelas oposições, a população começou a interessar-se pelo caso, primeiro por curiosidade – dada a relativa complexidade jurídica do problema – mas, depois, com manifesta indignação, suspeitando que, por detrás da manobra se esconderia alguma intenção fraudulenta. Talvez com a intenção de esbater o sentimento de repúdio que se alastrava, ter-se-á engendrado uma suposta doença para indigitada, o que não se confirmou.



  1. Lá surgiu, pois, com aspecto bastante saudável a Dr.ª Susana Inglês a ser recebida pelo PR. Para alguns, a audiência com o PR era o sinal de que o processo terminara por ali e nada mais havia para fazer. Que as autoridades judiciais iriam fazer a leitura de que a “ordem” estava dada e era para cumprir…



  1. Alguns partidos políticos na oposição foram, sucessivamente, esmorecendo o seu protesto e até capitulando. Terão abandonado a luta, conformando-se com o resultado da aparência. O Bloco Democrático (BD) e a UNITA foram os que mais se bateram para a reposição da legalidade. O BD e a UNITA impugnaram a eleição de Susana Inglês junto do Tribunal Supremo.



  1. Grupos de cidadãos desencadearam protestos de rua, de que resultou um atentado contra a integridade física e a vida do Secretário-Geral do BD, o Dr. Filomeno Vieira Lopes.



  1. No dia 17, depois de se ter completado o processo de registo eleitoral, em Acórdão, o Tribunal Supremo decidiu anular o concurso público que levou a Dr.ª Susana Inglês ao cargo de presidente da CNE.



  1. Tinham, pois, razão o Bloco Democrático e a UNITA quando persistiram na denúncia do acto administrativo do Conselho Superior da Magistratura Judicial. Estavam redondamente equivocados todos quantos se opuseram às denúncias feitas por esses dois partidos e, muito mais ainda, aqueles que molestaram os manifestantes pacíficos que mais não fizeram que mostrar na rua a sua indignação. Afinal, mais uma vez, a oposição recorreu a meios pacíficos e legais para fazer vingar a Lei e defender a democracia.



  1. De algum modo, a determinação do Tribunal Supremo vem “lavar” a imagem negativa que a nossa justiça tem carregado, pois, não poucas vezes, se assiste a flagrantes e incongruentes decisões que põem em xeque o próprio Estado de Direito. Daí que os cidadãos sejam muitas vezes estimulados a fazer uma avaliação negativa da nossa Justiça e de muitos dos nossos juízes.



  1. A reprovação da eleição de Susana Inglês pelo Tribunal Supremo tem, seguramente, profundas implicações jurídicas. É urgente esclarecê-las, para se minimizar os danos decorrentes da ilegalidade do seu exercício. Mas tem, igualmente, um forte impacto político sobre o processo eleitoral.



  1. Ao anular o concurso e, consequentemente, a eleição da presidente, voltamos ao ponto de partida. O seja, o cargo que a Dr.ª Susana Inglês ocupou ilegalmente está vago e terá que ser provido por via de um novo concurso público.



  1. E o que fazer com os actos administrativos que foram executados por quem não tinha legitimidade para o fazer? Só há uma solução: invalidá-los, expurgá-los.



  1. Quer então dizer que deixam de fazer fé, por exemplo, as nomeações pela Dr.ª Susana Inglês para o provimento das Comissões Provinciais eleitorais. Também deverão ser anulados os concursos realizados sob sua direcção para a auditoria ao ficheiro do registo eleitoral. Como fere formalmente os preceitos legais, o Memorando que foi entregue ao Presidente da República, autorizando-o a convocar as eleições deve ir para o lixo. E, seguramente, muitas coisas mais haverão para serem questionadas.



  1. Sem querer pôr em causa a honestidade dos juízes que reprovaram a eleição de Susana Inglês, penso que alguém irá retirar substanciais vantagens do impasse em que agora caiu o processo eleitoral. Falo, concretamente, do MPLA.



  1. Com um previsível adiamento das eleições, o MPLA ganhará tempo para “acalmar as suas hostes” que se encontram divididas quanto à escolha da segunda figura na sua lista eleitoral. Com o tempo dilatado, poderá também aproximar-se um pouco mais do cumprimento das anteriores promessas eleitorais. Terá ainda mais um pouco de fôlego para prosseguir a sua política de estímulo à divisão e desagregação de forças políticas na oposição que persiste em querer debilitar.



  1. Há dias, o Presidente da República graduou no posto de General o presidente do Tribunal Supremo, o Dr. Cristiano André, um facto que não me passou desapercebido. Interroguei-me sobre o porquê de uma tal graduação, feita pouco tempo depois de ele ter executado a estranha defesa do exercício do cargo de presidente da CNE pela Dr.ª Susana Inglês. Será que JES já previa o desfecho da contenda a que agora se assistiu e queria, com a graduação, minimizar os danos psicológicos sobre o Dr. Cristiano André? Ou será que queria estimulá-lo para uma mais cerrada obediência aos seus desígnios, lembrando-lhe, por exemplo, da necessidade de obediência ao Comandante-em-Chefe? Ou terá querido empurrar Cristiano André para um pedido de demissão, salvaguardando, por antecipação, a sua posição de General na reforma?



  1. É evidente que, nos próximos tempos, teremos ocasião de desenvolver um pouco mais esta abordagem. Porém, penso que em defesa das leis republicanas e da ética, devem ser dados todos os passos para se desbaratar a verdadeira trama que se criou em torno do processo eleitoral.



  1. Recordo que o processo eleitoral ficou com a credibilidade foi posta em causa não só pelo modo como decorreu o registo eleitoral (realizado sem lei ajustada) mas, igualmente, com a trapalhada que foi a eleição para presidente da CNE de uma advogada que, afinal, também é juíza, dependendo apenas das circunstâncias e dos interesses partidários do momento.



  1. Que tudo isso nos sirva de lição. E que se reconheçam, sobretudo, os muitos erros cometidos!

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