1. As recentes eleições presidenciais e eleições
legislativas que ocorreram em dois países europeus lançaram algum pânico entre a
classe política, e têm animado profundas especulações no seio dos analistas
políticos, pois podem estar a marcar o início de um novo ciclo político na
Europa.
2. As eleições
presidenciais francesas, que consagraram o candidato do Partido Socialista
francês, François Hollande, foram, talvez, as mais mediáticas, muito por causa
do peso político e económico que a França detém na União Europeia. Trata-se da
segunda economia ao nível da Europa e a quinta ao nível mundial.
3. Porém, os resultados das eleições legislativas realizadas
na Grécia, que cotaram muito positivamente quer a extrema-esquerda, quer a
extrema-direita, estão também a causar verdadeiras ondas de choque, lançando
densas nuvens de poeira sobre o actual modelo de integração no Velho
Continente. Vamos, pois, ver o essencial e as implicações do resultado das
presidenciais francesas.
4. François Hollande, o novo Presidente de França,
centrou a sua campanha eleitoral sobre três matérias fundamentalmente económicas.
A de maior impacto ao nível europeu é, sem sombra de dúvida, a sua manifesta vontade
de empreender uma renegociação do Tratado Orçamental, acordado por 25 dos 27
Estados da União Europeia, o que, a suceder, constituirá uma verdadeira ruptura
com o consenso que se havia estabelecido em torno da dupla Ângela Merkel/Nicolas
Sarkozy.
5. Em alternativa à austeridade de Merkel e Sarkozy (com
claros efeitos recessivos num número crescente de países), François Hollande
propõe também o aumento do orçamento europeu para o período 2014-2020 e,
sobretudo, um Programa de Crescimento Económico, com consequente criação de
emprego. Na sua visão, a prazo, o crescimento da economia conjugado com o
aumento do emprego conduzirão à estabilização macroeconómica, uma ideia que
começa a recolher adeptos na Europa, face à actual crise que se repercute e que
está a provocar inúmeros estragos económicos, sociais e políticos.
6. O novo Presidente francês defende ainda um maior
protagonismo na economia real por parte do Banco Central Europeu. Propõe que o
Banco Central Europeu passe a emprestar dinheiro directamente aos Estados e não
aos bancos, como vem fazendo até agora. Com tal mecanismo de empréstimo directo
aos Estados, François Hollande pensa reduzir o custo do dinheiro. Mostra-se,
igualmente, favorável a que o Banco Europeu de Investimentos dê crédito às
empresas.
7. Outra matéria económica que cria clivagem entre
François Hollande e a Sra. Merkel (e, anteriormente, com Nicolas Sarcozy) são
os “eurobonds”. Os “eurobonds” serão títulos de dívida representando todos os
países europeus, com uma taxa de juro calculada pela média ponderada de cada
país. Seria, pois, uma dívida comunitária, partilhada pelo conjunto dos países
da Europa.
8. A possibilidade da criação dos “eurobonds” divide
profundamente os protagonistas europeus, pois se há países que ficariam
beneficiados, há também aqueles que sairiam prejudicados. Os países mais
endividados, como Portugal, Irlanda e Grécia, passariam a ter acesso a dinheiro
mais barato, e ainda ganhariam tempo para mais facilmente resolverem os seus
problemas estruturais. As economias mais fortes sairiam prejudicadas, uma vez
que, para si, o custo do financiamento seria mais elevado.
9. Já se compreende agora melhor a feroz resistência
imposta por Ângela Merkel e Nicolas Sarcozy à questão dos “eurobonds”, matéria
que, entre outras coisas, supõe a criação de uma Agência de Dívida Europeia e
uma Política Fiscal Comum para o espaço comunitário – o caminho mais curto para
o estabelecimento de um verdadeiro governo europeu.
10.
François
Hollande mostrou-se adepto do aumento em 60 mil no número de professores, pela
melhoria do seu nível salarial (com vista a diminuir o insucesso escolar), e também
a uma maior autonomia universitária.
11.
Em matéria de
emprego, o recém-eleito Presidente francês pretende estimular o emprego dos
jovens e das pessoas com mais de 55 anos de idade, isentando as entidades
empregadoras de determinados encargos para com a Segurança Social. Faz força
pela penalização dos despedimentos colectivos e mostrou vontade de reduzir a
precariedade do emprego.
12.
Por fim, a chamada “Taxa Tobin” sobre
determinadas transacções financeiras, um imposto a ser criado com vista a
refrear algumas acções especulativas, foi também manchete na campanha eleitoral
de François Hollande. Aqui ele não se distinguiu de Nicolas Sarkozy, pois ambos
se mostraram adeptos da adopção deste imposto ao nível europeu. Aplicada de um
modo unilateral, a “Taxa Tobin” provocaria a deslocalização dos capitais para
fora de França.
13.
A ideia da
“Taxa Tobin” vai conquistando crescentes apoios na Europa, a começar pelo
actual Primeiro-ministro italiano, Mário Monti, outro político que se vem
afastando, de alguns dias a esta parte, das propostas de austeridade de Ângela
Merkel e Nicolas Sarcozy.
14.
As políticas de
austeridade estão a mostrar-se altamente recessivas, têm levado ao
empobrecimento de largos sectores da sociedade europeia, ao desemprego, à
agressividade contra os estrangeiros e ao sectarismo. Está agora na mesa uma
nova abordagem que vem de França e que tem do outro lado, como historicamente
tem sucedido, a Alemanha. Felizmente, nesta altura, a Europa possui mecanismos
democráticos para resolver pacificamente estes problemas. No passado, não os
tinha. Daí que tenham sobrevindo as guerras…
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