terça-feira, 21 de agosto de 2012

COMPORTAMENTOS ATÍPICOS


  1. Na segunda metade da campanha para as eleições gerais de 31 de Agosto, já há alguma matéria para analisar. Hoje, debruçar-me-ei sobre duas que eu acho interessantes. Para o tempo que nos resta até ao fim, sobrarão, seguramente, outras.

  1. Baseadas na Constituição aprovada em 2010, estas eleições gerais são, realmente, muito atípicas, uma vez que permitem a escolha do Presidente da República – e, por extensão, do Vice-presidente – juntamente com os deputados ao Parlamento. Um tal esquema, pouco usual de eleição, permitiu a opção por um modelo de tempo de antena que subalterniza a figura dos futuros deputados, a quem não se dá espaço algum, ou quase nenhum.

  1. Por não estar dissociada a eleição de uns e de outros – do Presidente e dos deputados – os tempos de antena são dominados pelas imagens do candidato a Presidente, ficando os candidatos a futuros deputados quase sem trabalho: vão apanhando boleia na “viatura” do Presidente. Isto sucede em todas as candidaturas.

  1. Todos os partidos políticos nem se dão ao incómodo de expor ao público a fotografia do seu candidato a Vice-presidente. Também não se lhes vê o rosto nos tempos de antena. Eles e os deputados. Dá até vontade de dizer que “lutam na clandestinidade”.

  1. Quero então dizer que, nestes termos, quem figura em segundo lugar numa eventual lista vencedora será, no final de contas, o maior “maguelador” da corrida eleitoral, uma vez que até tem a possibilidade de vir a ser Presidente da República sem que para isso se tenha batido verdadeiramente. Mas, o quê que isso significa? Significa tão-somente que poderemos ter “em mãos” alguém que não foi suficientemente avaliado. Recordo que, para o imaginário público é, sobretudo, o perfil do candidato a Presidente que está a ser questionado. A figura do Vice, por força da quase exclusiva visibilidade do primeiro, está ser relegada para segundo plano.

  1. Em eleições presidenciais típicas, a dupla Presidente/Vice-presidente é demasiado importante, o que fica bem espelhado nas eleições norte-americanas. Por exemplo, o ex-candidato presidencial pelo Partido Republicano, John Mc Cain, uma figura fisicamente debilitada face à pujança do candidato do Partido Democrático – Barack Obama – optou por cobrir o seu aparente défice com a escolha de uma mulher para o secundar, como candidata a Vice. E o candidato presidencial democrata, o relativamente jovem Barack Obama, escolheu um senador de idade mais madura e de larga experiência política para o secundar como candidato a Vice, dando, assim, uma maior confiança ao eleitorado.

  1. A estratégia republicana, baseada no género – ou seja, um homem e uma mulher, no pressuposto de chamar para si a adesão dos dois lados do ser humano – falhou, entre outras razões, porque a mulher escolhida para secundar o Presidente, e substitui-lo em caso de necessidade, mostrou-se bastante desastrada, tendo feito intervenções públicas que lançaram sérias dúvidas sobre a sua real capacidade para dirigir o destino do país.

  1. Por sua vez, a estratégia democrata de compensar a juventude do candidato a Presidente com a experiência do candidato a Vice mostrou ser mais consistente, relegando para plano secundário a ideia do equilíbrio no género.

  1. Quer, então, dizer que ser candidato a Vice-presidente não é algo de somenos importância, sobretudo se o Vice tiver constitucionalmente possibilidade de se tornar Presidente, sem que se realize imediatamente nova eleição. Foi o que sucedeu com a substituição do Presidente John Kennedy por Lindon Jonhson, por morte do primeiro. Viu-se também agora no Ghana e no Malawi, onde os Vice substituíram os Presidentes, por morte destes.

  1. Na realidade, se houve quem tivesse alimentado a ilusão de estarmos num processo eleitoral verdadeiramente típico, enganou-se. Tem agora suficientes razões para desfazer tal equívoco. E não precisará de rebuscar muito na memória, dado que, diariamente, saltam-nos à vista comportamentos e atitudes no mínimo ilustrativos do modo desequilibrado como são tratados publicamente os diversos intervenientes no processo eleitoral. Estamos, sim, perante mais uma “atipicidade” do nosso processo político eleitoral.

  1. Refiro-me concretamente à gritante parcialidade como um órgão público da comunicação social utiliza as suas páginas para zurzir sobre as costas dos principais contendores que estão na oposição, e o modo como “leva ao colo” o partido da situação. Em relação a partido da situação, tal órgão de comunicação social nunca poupa espaço para se desfazer em encómios. Inclusive, trata matérias menores (e sem qualquer relevância especial) como se fossem factos marcantes na história do nosso povo.

  1. Na análise dos tempos de antena e dos actos públicos de determinados partidos (e coligações) na oposição, ele chega a cair no insulto reles, no destrato, deturpando, por vezes, as ideias que são apresentadas. Pelo modo raivoso como vergasta algumas oposições, fazendo-me lembrar o tempo colonial, quando os administradores de posto instruíam os seus cipaios para surrarem – até fazer sangue – os “rebeldes” que se negassem a pagar o “imposto indígena” ou quem desobedecesse às suas iníquas ordens coloniais.

  1.  Não sou dos que, eventualmente, pensam que se deva deixar passar em branco os erros cometidos por responsáveis de partidos da oposição, ou que se deva fazer do partido no poder o “saco” onde todos os boxeiros devem exercitar os seus bíceps, criando a ideia de que ele é fonte única de todos os nossos males, o culpado de todas as nossas desgraças. Tenho, porém, a convicção de que, num quadro como o actual (em que se repete até à exaustão a necessidade de se exercer a escolha de um modo consciente), compete principalmente aos órgãos públicos de comunicação social guardarem suficiente serenidade, funcionando como espaços, de facto, ao serviço da comunidade e não como órgãos virtualmente criados e pagos por um qualquer partido político.

  1. Quando aos órgãos de comunicação social privados, o máximo que se lhes pode pedir é que façam o possível para preservarem uma conduta civilizada. Que sejam eles também contribuintes para a criação e/ou a manutenção da paz social. Não se lhes pode exigir total imparcialidade, já porque são propriedade privada, obedecendo, no essencial, ao interesse dos seus proprietários. Que pugnem por um comportamento de razoável equilíbrio, pois o interesse pessoal de um qualquer empresário (ou grupo de empresários) nunca pode ser superior ao interesse do conjunto da nação.

1 comentário:

  1. Boa análise professor, mas pelo que tenho visto dos tempos de antena da UNITA, e tenho visto quase todos, aparecem sempre os seus candidatos a deputado. Inclusive, um dos seus mais recentes tempos de antena, que lidava com a juventude, foi apresentado pelo seu candidato a vice presidente, o Sr. Ernesto Mulato.

    ResponderEliminar