segunda-feira, 17 de junho de 2013

A “CAIXA DE PANDORA” E A EXPANSÃO DO “BIG BROTHER”


1.  Hoje em dia, uma das questões mais em foco é, seguramente, a do direito à privacidade dos cidadãos posto cada vez mais em causa pelos serviços de inteligência dos EUA. Isto porque um jovem informático, de nome Edward Snowden – que em tempos cooperou com os serviços secretos – resolveu denunciar a magnitude dos programas de vigilância telefónica e electrónica, da responsabilidade da Agência de Segurança Nacional norte-americana, em curso quer nos EUA, quer no estrangeiro. Diz-se, agora, que esta acção do jovem informático destapou uma nova “Caixa de Pandora”.

 

2.  A “Caixa de Pandora” é uma figura da mitologia grega e retirada da Ilíada de Homero. Segundo essa mitologia, Pandora teria sido a primeira mulher criada por Zeus, e a Caixa seria um grande jarro dado a Pandora e que continha todos os males do mundo. A pedido de Zeus, o deus das artes, Hefesto, fizera uma mulher parecida com os deuses, personificada numa linda estátua. Da deusa Atena, a estátua recebeu o sopro da vida. Da deusa Afrodite recebeu a beleza. Do deus Apolo recebeu a voz suave. De Hermes recebeu o dom da persuasão. Surgiu assim uma mulher cheia de tudo que, por isso, recebeu o nome de Pandora – aquela que tem todos os dons.

 

3.  Na história de Pandora entram ainda o titã Prometeu e seu irmão Epimeteu. O titã Prometeu e seu irmão Epimeteu teriam criado os animais e os homens, dando aos animais os poderes de voar, caçar, a coragem, os dentes afiados. O homem, por ser o último a ser criado por Prometeu, ficou sem nada. Assim, Prometeu deu um pouco de cada um desses dons ao homem.

 

4.  Pandora aproximou-se de Epimeteu que, por alerta de seu irmão Prometeu, não deveria aceitar nada dos deuses. Mas Epimeteu não resistiu ao encanto e beleza de Pandora que se fizera acompanhar de uma caixa, como presente de casamento para Epitemeu. Curiosa, e desobedecendo as ordens de Zeus (seu criador), Pandora decidiu abrir o jarro, libertando, dessa forma, para o mundo todo o seu conteúdo: a inveja, a discórdia, a guerra, o medo, o ciúme, com excepção de um único dom – a esperança. Nessa mitologia, a mulher, personificada por Pandora, fica demasiado penalizada: surge como a causadora de todas as desgraças da humanidade.

 

5.  Ao denunciar as acções de vigilância dos serviços secretos norte-americanos, Edward Snowden pôs a descoberto uma nova “Caixa de Pandora” que se esconde no sistema de espionagem coordenado pela Agência de Segurança Nacional dos EUA. Ele declarou o seguinte: “A Agência de Segurança Nacional construiu uma infra-estrutura que lhe permite interceptar quase tudo. Com essa capacidade, a grande maioria das comunicações humanas são automaticamente integradas no sistema de forma discricionária. Se eu quisesse ver os seus emails ou os telefonemas da sua mulher, bastava aceder a esse registo. Eu posso obter a informação relativa aos seus emails, palavras-chave, registos telefónicos, cartões de crédito”. Com esse sistema, a Agência de Segurança Nacional recolhe dados das empresas de telecomunicações como a Verizon e de gigantes tecnológicos como a Microsoft, Apple, google e Skype, e ainda as redes sociais como o Facebook.

 

6.  Mais ou menos na mesma altura em que Edward Snowden fazia tais revelações, os Presidentes dos EUA e da China reuniam-se na Califórnia com a questão da pirataria cibernética na agenda, com os EUA ao ataque acusando os chineses dessas práticas que põe em causa a segurança norte-americana. Ficou, pois, agora, provado que, em matéria de pirataria informática, nenhum deles é santo. Nem eles nem os outros…

 

7.  O jovem informático, Edward Snowden, justificou a sua acção nos seguintes termos: “Não quero viver numa sociedade que faz este tipo de coisas, num mundo onde tudo o que eu faço e digo é registado”. Ele está, presentemente, refugiado em Hong Kong, território chinês. Nos dias de hoje, a China é precisamente um dos países mais atacados, por causa da pirataria informática. Terá, por isso, muita dificuldade em convencer as autoridades chinesas da bondade da sua acção.

 

8.  Ao destapar a sua “Caixa de Pandora”, Edward Snowden recolocou sobre a mesa a problemática das sociedades modernas, onde o “Big Brother” se aperfeiçoa cada vez mais. O “Big Brother”, o “Grande Irmão”, é a ficção de uma sociedade na qual as pessoas estão sob permanente vigilância das autoridades, sendo constantemente lembradas pela frase propaganda do Estado: “O Grande Irmão zela por ti”, ou “O Grande Irmão observa-te”. Deve-se ao livro de George Orwell, intitulado “1984”.

 

9.  Hoje, o “Big Brother” não se personifica apenas na vigilância por parte dos governos mas, também, por parte das empresas. Uma invasão da privacidade que se tornou uma necessidade dos tempos modernos.

 

10.                Com o aumento e a sofisticação dos actos delituosos, os mecanismos de vigilância sofisticaram-se, tornando obsoletas algumas normas legais que foram construídas com vista a garantir a privacidade dos cidadãos. George W. Bush, antigo presidente dos EUA, apressou-se a violar as 4ª e 5ª Emendas Constitucionais, na sequência dos atentados de 11 de Setembro de 2001, em homenagem à necessidade de uma luta mais eficaz contra o terrorismo.

 

11.                Barack Obama não tem forma de materializar a sua promessa de alargar o espaço das liberdades individuais, uma vez que, todos os dias, se confronta com acções terroristas que põem em risco a vida de muita gente e até mesmo a segurança nacional. E, pelos dados que chegam ao nosso conhecimento, a sociedade norte-americana parece preferir, maioritariamente, ceder uma grande parte da sua privacidade, em troca de uma maior garantia de segurança.

 

12.                Edward Snowden ousou destapar a sua “Caixa de Pandora”, mas, segundo vejo, terá muita dificuldade em parar a expansão do “Big Brother”… Mesmo assim, dá-se-lhe o mérito de ter reintroduzido a discussão sobre os limites da privacidade num mundo moderno e cada vez mais perigoso.

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