quinta-feira, 1 de outubro de 2015

A “DERRAPAGEM” DO ACORDO DE CONVERSÃO MONETÁRIA


1.  Em Setembro de 2014, as autoridades monetárias de Angola (BNA) e da Namíbia (Bank of Namíbia) assinaram um “Acordo de Conversão Monetária”, de carácter limitado, garantindo a conversão das moedas nacionais dos dois países, mediante determinadas condições:

 

i)                   Os angolanos adultos que pretendam entrar na Namíbia por terra - atravessando a fronteira Santa Clara/Oshikango - poderiam converter, na parte namibiana, kwanzas em dólares namibianos, até ao limite máximo de 500.000 kwanzas; para os angolanos menores de 18 anos, o montante a converter teria como barreira 150.000 kwanzas;

ii)                 As pessoas singulares não residentes cambiais, maiores de 18 anos, seriam autorizadas a cambiar um valor não superior a 250.000 kwanzas; por sua vez, pessoas singulares não residentes cambiais, menores de 18 anos, poderiam cambiar até um máximo de 50.000 kwanzas;

iii)               Dos dois lados da fronteira haveria, pois, agentes autorizados - bancos ou casas de câmbio - a realizarem a troca das moedas.

 

2.  O objectivo anunciado pelo Governador do BNA foi o de facilitar as relações comerciais entre os dois países e, também, garantir um mais exitoso contacto entre as suas populações, além de, desse modo, se evitar a intermediação por moedas não emitidas nos dois países.

 

3.  Recordo que, geralmente, os cidadãos angolanos ou cambiavam no lado de cá da nossa fronteira, recorrendo a cambistas informais, ou então, transportavam consigo dólares norte-americanos depois aceites no território namibiano. Na Namíbia circula livremente que o dólar namibiano, quer o rand sul-africano.

 

4.  Creio eu que, com a nova medida, as autoridades monetárias angolanas pensavam ser possível barrar ou, no mínimo, reduzir o impacto do mercado informal de moeda instalado nas redondezas da nossa fronteira.

 

5.  Mas, a nova medida não tomou em devida conta o sentido do fluxo comercial entre os dois países e, muito em especial, naquela área geográfica.

 

6.  De um modo geral, o comércio corre no sentido Namíbia – Angola, e não contrário, devido ao facto de ser maior a oferta mercantil no país nosso vizinho. São os angolanos que vão fazer compras na Namíbia, onde podem efectuar pagamentos quer em dólares namibianos, quer em rands sul-africano.

 

7.  Tudo parecia estar devidamente preparado e encaminhado, com os dois bancos centrais envolvidos na operação a criarem as prévias condições técnicas e operacionais, realizando, inclusive, seminários em todas as instituições bancárias e outros interesses. De seguida, publicitou-se a entrada em vigor do Acordo, com toda a pompa e circunstância…

 

8.  Não passou muito tempo, e, inesperadamente, o Governador do BNA declarou, em Benguela, que o processo recentemente iniciado havia perdido o “controlo”, ou seja, havia “descarrilado”, passando a responsabilidade pelo “fiasco” à parte namibiana. Disse haver excesso de moeda angolana a circular do outro lado da fronteira.

 

9.  O excesso de kwanzas acumulado do outro lado, só pode ter duas razões: i) ou são muitos os angolanos que atravessam a fronteira, levando as quantidades estabelecidas no Acordo, fazendo normalmente as suas transações; ii) ou há angolanos que atravessam a fronteira com mais moeda nacional do que a permitida, transacionando-a do outro lado, fora dos parâmetros definidos. Só que se atravessam a fronteira com excesso de kwanzas, então, fazem-no com conivência do nosso lado.

 

10.                  Uma consequência natural desse fluxo vertiginoso de kwanzas para a Namíbia tem sido a carestia de kwanzas nas instituições bancárias de Ondjiva e Santa Clara, com repercussões negativas sobre quem aí vive.

 

11.                  Não me parece, pois, muito justo passar o ônus completo da actual situação à parte namibiana, mesmo que ela admita ter convertido kwanzas em montantes superiores ao acordado. Seria possível controlar esse câmbio, quando há demasiados agentes autorizados a fazê-lo?

 

12.                  Vejamos ainda o seguinte: caso um mesmo cidadão angolano faça múltiplas travessias na fronteira, ele pode levar para o território namibiano avultados valores em kwanzas e, naturalmente, realizar a sua troca. Com tal “esquema” até conseguirá escapar à dificuldade que toda gente hoje sente para obter outras divisas como, por exemplo, dólares norte-americanos.

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